terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Duas irmãs e um vício - Mulheres da Cavada

Nega e Luzia

Nega e Luzia são tias maternas de Marcos, duas irmãs icônicas que vivem na Cavada I. Ambas largaram os maridos para viver outra paixão – o alcoolismo. Nega, alcunha de Angélica Evangelista de Souza, vive sozinha na casa onde a mãe, dona Zinha, foi sepultada no quintal. Na minha tenra infância sentia muito medo de dona Zinha. Fosse sol ou chuva, saía ela, enrolada num cobertor, perambulando em toda parte. Nega não nega o vício, e hoje tenta driblá-lo tão habilidosamente quanto Justino, seu filho, que no campo de futebol cortava os adversários com a bola, quando nas horas em que não dirigia um dos únicos ônibus que transportava os moradores à Vitória da Conquista.

Luzia parece seguir o destino da mãe. Vaga pelas estradas onde mora, sempre com sua principal arma a punho – um pedaço razoavelmente grande de madeira. Os principais vilões: os malvados cães. Defende a si mesma de tantos caninos livres – em média três por casa –, enquanto rende-se ao dissabor da aguardente. A cachaça pinga em suas entranhas como uma espécie de combustível. Com uma única golada, saciava aquela que parecia ser uma sede inevitável. Viúva, e com uma filha que não pode minimamente criar, ela cantarola as músicas que compõem durante seus devaneios, conversa com outros que nunca sabemos quem são.

Luzia já passou dos quarenta. Nunca a vi trajada de calças e sem o inseparável pano que cobre os cabelos crespos. Com suas insubstituíveis saias de seda e blusinhas de alça, parece viver num eterno passeio, farejando mais do que pingas puras ou temperadas, mas o tempero da própria sobriedade.

Numa tarde que antecedia a virada do ano de 2010, deparo-me com as duas na casa de Eliene, minha tia materna. Foi-me revelado por ela que a família desistiu de internar Luiza numa clínica psquiátrica, após algumas tentativas de fuga. Ela enterrava os remédios que lhe foram recomendados e, vez ou outra, ameaça bater nos sobrinhos. Enquanto isso, Nega ainda biliscava alguns copos de cachaça bares afora. Ficava dias na casa da nora, ajudando Eliane. Qualquer momento de recaída, curava na própria casa a rassaca.

Despedi-me de Nega, pedindo-lhe sua bênção. Recebi o "Deus te dê boa sorte, meu filho!". Luzia, mandou lembranças aos meus irmãos e perguntou quando eu retornarei a Bahia. "Brevemente Luzia, brevemente..."


*A imagem acima foi feita em 28 de dezembro de 2010. Luzia e Nega assistem ao programa Chaves, na casa de Eliene, esposa do filho de Nega. Veja outras imagens das irmãs no álbum "Vida em Crônicas, no Picasa.

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