Visitar grande parte dos cartões-postais de Salvador trouxe renovação ao baiano que nunca havia pisado em terras soteropolitanas, em 23 anos de vida. A fortaleza do sol no Farol da Barra, a Praça da Sé, o Elevador Lacerda fizeram-me perder a coloração amarelada da pele, assim que cheguei em Barra do Choça, na véspera de Natal.
Os parentes logo me gozavam, “ô amarelo, vai tomar um solzinho, vai” - e por mais que eu não quisesse, me livrar do calor escalcante do verão na Bahia era algo impensável. Mas foi na cidade do Pelourinho que uma pedinte me fez ter a certeza que a tonalidade de minha epiderme, de fato, não era mais a mesma. “Me dá uma moeda aí, moreno!”.
Os parentes logo me gozavam, “ô amarelo, vai tomar um solzinho, vai” - e por mais que eu não quisesse, me livrar do calor escalcante do verão na Bahia era algo impensável. Mas foi na cidade do Pelourinho que uma pedinte me fez ter a certeza que a tonalidade de minha epiderme, de fato, não era mais a mesma. “Me dá uma moeda aí, moreno!”.
Para a noite, marquei um encontro num barzinho, na Cidade Baixa, com conterrâneos que conheci durante o tour solitário durante o dia – com muita inveja, claro, do sotaque carregado deles, que eu infelizmente não tinha. O que seria um bate-papo à beira-mar, ao som das ondas, na parte baixa da Igreja Senhor do Bomfim, tornou-se uma festa ao aniversariante Geraldo, que completava 32 anos. Cláudio, o organizador da surpresa, me levou à churrascaria onde comemoramos mais um ano de vida do amigo. Encontramos Geraldo no meio do caminho e e fomos todos juntos ao restaurante. A mesa, com reserva para 15 pessoas, contava com a presença de 9 convidados.
Entre carnes de cupins e corações, pizzas superfinas, cerveja e muitas risadas, a figura principal da noite não foi Geraldo, e sim Manuela – a garçonete. Seria uma atendente qualquer, caso não fosse detentora de uma simpatia ascendente – tão ascendente, que em pouco tempo, praticamente servia apenas nossa mesa. Fez amizade com a mesma habilidade com que carregava as bandejas.
“Qual o signo de vocês?”, inqueriu. Cada um foi revelando o seu. Eu, o último a responder, afirmei ser ariano. Quase como uma criança afoita, quando recebe um presente novo dos pais, Manuela abriu o sorriso metalizado e me cumprimentou por também, como ela, ser regido pelo signo de Áries. “Toca aqui. Eu sabia. Fala sério, os arianos são demais”. Aquela situação foi uma espécie de estopim para a que emergente simpatia desse início a uma possível amizade.
"Aqui é pra você...”, retirou do bolso do uniforme azul claro um pirulito em formato de coração. “Só porque você é ariano”. Todos riram, no mesmo momento em que ela distribuiu outros doces a cada um. Em seguida, enquanto servia pizzas de calabreza, num minúsculo pedaço de papel me deu seus endereços virtuais. “Aqui estão o Orkut e MSN.”
Entre o trabalho e a vontade de bater papo com o grupo, a garota foi falando de sua vida: 22 anos de idade, ensino médio incompleto – mas garantiu retornar ainda este ano e continuar o 2ª ano –, há poucas semanas trabalhava na churrascaria e morava não muito distante dali. "Venho de bicicleta às vezes."
O expediente acabou. Enquanto os funcionários limpavam o salão, discutíamos com o gerente a diferença no valor da comanda da mesa. Manuela, depois de se livrar do uniforme, ficou nos aguardando. Saímos juntos, cada um pro seu curso. Manuela pegou carona à pé com o gerente, rumo a sua casa, e como que uma ordem, nos intimou à adicioná-la nas redes virtuais. “Me adiciona no MSN tá! No Orkut pareço outra até pessoa. Tô mais bonita!”, sorriu.
6 comentários:
Ótimo texto!
Não é todo dia que encontramos pessoas "doidas" assim, que esbanjam simpatia, alegrando a vida de outras pessoas.
Curti muito o jeito da Manuela.
Ah Vagner... não deveria nem repetir, viu. Mas como sempre um ótimo texto! Muito agradável, bem estruturado e pontuado. Impossível não imaginar todas as cenas descritas por você, talvez não da forma que exatamente aconteceu, mas com uma perfeição tão grande que tem vida e realidade - ainda que na imaginação apenas.
Alías, AMEI o título do seu texto! Muito legal mesmo.
Parabéns!
Beijos.
Luisa, estava tão inspirado para escrever sobre a Manuela, que a crônica foi, sem dúvida, um grato presente. Conseguiu muito bem resumir e destacar a essência da jovem baiana. Fico feliz que tenha curtido e espero que continue acompanhando a série “Mulheres da Cavada”. Outras personagens interessantes ainda estão por vir.
Beijo.
Vagner
O texto que retrata o passeio de SSA tá ótimo, gostei muito...
Vagner, baiano!
Eu virei sua fã, rapaz!
Só queria dizer isso.
Beijo.
Oi Karol,
Minha fã? Assim fico, encabulado : /
Seu carinho e amizade já são os maiores presentes
Beijo!
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