quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Sampa

Por Henrique Pires

Na Avenida São João, me perco e percebo o quanto não sou paulista nato.
Nasci aqui, mas meu coração se criou no interior.
E é lá que ganhei esse costumeiro jeito de me importar com o que falo.
Não digo exatamente com a forma, mas dou validade o que pronunciou e tento ser coerente, na maior parte das vezes,
com o que exponho em forma de discurso.

A palavra na capital é mais perecível. Vive morrendo.
É breve como a espuma de um chopp.
Em Sampa, nos vendemos.
Nos vendemos em todos os sentidos.

Hoje habito num apartamento com janela para um parque,
e nessa semana fui acordado por periquitos.
Tantos anos no interior...
E não me recordo de tal despertador.
Ironia.
Na selva de pedra há, às vezes, a presença maior da natureza.

Nada me dá mais certeza de ter nascido aqui do que a Paulista.
Em seu percurso, sinto de uma forma íntima que sou filho dessa cidade.
Sempre acontece. Poderia dizer que é lá que me sinto pertencente aqui.
Mas esse pertencimento não é total
e quando me perco me vejo com saudades da minha outra mãe.

Não sou apaixonado por São Paulo.
Sou grato.
Ela me torna um filho mais independente e me faz enxergar vidas que não são minhas, algumas extremamente sofridas.
Ou o sofrimento é meu por não ver nelas a beleza que possuem.
É gente guerreira que aqui habita. É gente mais do que isso.
Eu sinto sempre que ando pela São João
um estranhamento e um contentamento que me faz permanecer aqui.

imagem: Pinacoteca do Estado

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