segunda-feira, 25 de julho de 2011

A blusa azul marinho


Ela fica praticamente escondida dentro da primeira gaveta onde guardo minhas camisetas. Há anos, permanece ali no seu cantinho próprio.

Uma camisete azul.

Esse foi o presente que dei à minha mãe em seu 40º aniversário. Simples, a blusinha não continha nenhuma costumização, até que, semana seguinte, pequeninas miçangas ganharam espaço entre a direção dos botões brancos e duas flores miúdas foram costuradas no lado direito, bem no alto do peito.

Presentear alguém sempre foi uma terrível labuta para mim. Encontrar o ideal, aquele que não fizesse minha mãe torcer o bico, era tarefa árdua.

Cogitei a hipótese de comprar algum calçado, até lembrar que no dia das mães havia lhe dado um par de sandálias plataforma. Mas dias depois, sem jeito, dona Osmilda me perguntou se podia trocar o calçado com a minha prima. Errei feio! “Claro, mãe, o presente é seu”.

Dessa vez acertei em cheio a escolha da camisete: simples, sem detalhes, gola alta, mangas curtas, justinha no seu corpo magro. Sem modéstia nenhuma, a blusa azul marinho caiu perfeitamente! Bingo!

Certo dia, meu tio, vasculhando não sei porque minhas coisas deu de cara com a blusinha. Com um ar de deboche e a piada prestes a pular de sua língua... Logo adiantei: era de mãe.

Se não me falha a memória, minha mãe nunca usou uma blusa que não fosse estilo camisete. Exceto um dia em que ela me chamou em seu quarto, sugerindo uma opinião minha sobre a roupa que usaria para ir à cidade: uma camiseta folgadassa - certamente comprada em algum dos brechós que adorava visitar em São Paulo - com uma estampa gigantesca do Michael Jackson dos anos 80 na parte frontal. “Tem outra sugestão melhor não?”, propus. Dá pra não dizer que a risada rolou solta?

Nutrir a saudade com uma fotografia na carteira? Um portarretrato pendurado na parede do quarto? O que levar consigo, quando a pessoa que você mais amou na vida não está mais presente para lhe dar bom dia, para resmungar quando você lhe compra um presente que não agradou? Rever os vídeos? Fazer o prato preferido, mesmo que o saboreie sem sua companhia?

Dentre todas as alternativas possíveis, decidi carregar comigo a blusa azul. Mesmo sem a presença do cheiro de minha mãe, permanece sendo a lembrança mais fiel que tenho carregado nos derradeiros anos. Mais do que o espaço garantido dentro da primeira gaveta da cômoda, é no coração, eternamente, o lugar cativo que ela sempre terá.

2 comentários:

Jorge disse...

Muito linda essa cronica.Como eu queria poder parar o tempo e deixa que minha vivesse para sempre na minha vida.Sinto muito a falta dela.

Wadila de Alencar disse...

Parabéns irmão!

Como sempre suas crônicas tocam o coração do leitor.

Nem sabia que guardava uma blusa dela, pois é ! A saudade é grande mesmo.

Mas as lembranças permanecem.