quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

MAGNObal

Por aquelas redondezas, palavra mais carregada de preconceito como Magnobal não há.

Com o passar dos anos, muitas transformações fizeram parte de sua trajetória: mudanças físicas, quanto psicólogicas. O nome foi, talvez, a única coisa inalterada, enquanto o corpo deu espaço às feições femininas. Enfrentar os julgamentos de vizinhos, que o viram crescer e que, ainda fazem-se tão intolerantes ao tratá-lo com um desconhecido, foi - e talvez continue sendo - uma árdua tarefa para ele.

Ele tem 32 anos. Adulto, encara a homossexualidade com certa naturalidade. Na adolescência sofreu com força, o que hoje ganha título de bullying. Os cabelos foram alongados. Os mamilos, também – pequenos seios apontam de seu peito. Com uma estatura alta, Magnobal não passa despercebido. As pernas grossas, quase sempre a mostra, por meio dos mini-shorts lhe expõem a bunda avantajada. Um homem, que no topo de suas três décadas de vida, sente-se uma mulher. Mesmo vivendo na bucólica e ainda conservadora Cavada 2 aprendeu a conviver com as críticas, com o preconceito e tenta, do seu modo, continuar nutrindo as poucas ambições que tem. A irmã dele, Carla, garante: “Quinho está desperdiçado aqui. Se ele fizesse um curso para chefe de cozinha se daria muito bem na vida.”

Ele cuida dos cabelos como ninguém, é o que assegura Viviane (na foto). A esposa de Benevenuto recebe o melhor amigo praticamente toda semana, quando lhe tem por ele, a cabeleira espichada e tingida, de tempos em tempos. O salão de cabeleireiro tem improviso no quarto, onde eles atualizam o papo, além de saborear os dotes culinários, outra aptidão de Magnobal.

Catou café na roça. Já foi cozinheiro noutra cidade. E até ganhou concurso amador, como dançarino. Em Vitória da Conquista, ele arranjou o primeiro emprego. Substituiu os corredores das abundantes roças de café espalhadas pelo município para exercer afazeres domésticos na casa de estranhos, em troca de salário completo. Quinzenalmente, pegava o único ônibus, em direção à Cavada 2.

A sala de aula foi ausentando-se, à medida em que a necessidade do trabalho tomou à frente das necessidades que lhe convinham naquele momento. Em 2010, retornou aos estudos, concluiu a 5ª série do ensino fundamental. Lidou com a indiferença, palestrando às demais turmas do colégio– sugerido pela direção da escola – acerca de uma temática a qual dominava mais do que qualquer discurso proferido por algum professor. Magnobal passou de sala em sala. Respondeu as perguntas diretas dos colegas. Quebrou tabus. Sem pudor, esclareceu dúvidas e rebateu chacotas. Falou de si próprio àqueles que acreditavam saber mais do que quem sentia na pele a realidade de ser homossexual.

Magnobal segue na contramão do desejo de tantos por ali, que almejam, na primeira oportunidade, pisar os pés em território paulistano. Teme deixar o berço para aventurar-se em terras que lhe são distantes. “Nunca fui a São Paulo e não tenho muito vontade de ir, não.” Ele prefere dançar a música que rege sua vida, ali mesmo. Não espera que ninguém dance com ele, mas, que ao menos respeite e conceda a passagem, para que possa além de apresentar, no palco, dignamente, a grande ambição que ainda nutre, mesmo que com certa descrença: “Meu sonho é ser dançarino, mas sei que existe preconceito quando se é homossexual como eu”.

5 comentários:

Unknown disse...

Estou muito orgulhosa de você. Seu texto é muito bom. Agradável leitura e com gostinho de quero mais...Parabéns pelas palavras e a maneira suave de abordar o tema...

Robson Bezerra disse...

Uma abordagem sutil e interessante de um assunto que é tabú e nos r faz refletir da importância dele.

Robin A. disse...

Quisera eu saber qual o meu papel no mundo, com a convicção e a certeza de Magnobal. Se o show tem que continuar, há que se ter atores com seus papéis bem marcados. Palmas, Magno.

@geraldopost disse...

Mais um belíssimo texto. Que nos provoca reflexão e que qualquer comentário sobre sua qualidade seria pequeno.

Lucas Ramos disse...

Essa certamente é a história que mais me toca no momento,pois sem e vivo na pele o preconceito das pessoas deste lugar.Hoje aos meu 17 anos de idade e junto com meu amigo Magnobal e Reynaldo lutamos para acabar com essa herança de exclusão que muitas das vezes vivenciaamos em Barra Nova.Devo lembrar que hoje sentimos mas acolhidos e respeitados mas a luta por um lugar mas acochegante no sentido de nos aceitar como somos não importando por nossa orientação sexual continua...