domingo, 30 de outubro de 2011

Um jovem jornalista


premiação no teatro TUCA, 24/10/2011

Estava sentado no colchão estirado no chão no quartinho que antes era uma lavandeira, quando recebi a chamada da Denise. Cabreiro, como que preocupado com qualquer outra coisa, menos com a ligação de minha professora e orientadora do TCC, às onze horas da noite de uma quinta-feira, eu atendo a ligação.

- Alô, Vagner! – simultaneamente ela exclama e interroga – Pode falar?. Respondo que sim, enquanto milhões de pontos de interrogações parecem brigar dentro da imaginação. Sua voz meio que cambaleando nas palavras que viriam a seguir, saem com a respiração visivelmente ofegante. – Parabéns, você é um dos vencedores do Prêmio Jovem Jornalista!!!

- Verdade, Denise? – repeti ao menos uma meia dúzia de vezes essa indagação, seguidas de outras dezenas de "Não acredito!". Ela, que ponderou sua resposta, disse ainda não ter certeza, mas que tudo indicava que sim, ao menos, e principalmente, a página do concurso.

- Não acredito! – com a voz cortando o choro eminente, eu declarava – Nossa, Denise, não acredito que eu ganhei o Herzog! Ela aproveitou para soltar um “nem eu”. Outros parabéns vieram. Ela dizia estar tremendo. Eu estava completamente extasiado.

- Parabéns, Vagner! – ela prosseguiu. Sem saber se chorar de vez, explodir de sorrir de tanta emoção, o obrigado foi o dito.

Assim que desligamos o telefone, eu gritei. Chorando de tanta felicidade, eu gritei novamente. Chorei assim como ainda me emociono ao lembrar especialmente daquela noite, e também agora enquanto escrevo essa crônica.

Paraisópolis, que há pelo menos 16 anos faz parte da minha vida, decerto não poderia deixar de ser o eixo fundamental que une a premiação ao premiado. E ela foi  pano de fundo para o projeto de reportagem que me tornou, em parceria com minha colega de faculdade, Bruna, a vencer o concurso. Detentora do título de segunda maior favela de São Paulo, além de ter as duas piores escolas de ensino fundamental de todo o Estado, a pauta que devia relacionar-se com uma das oito metas do milênio teve como mote o questionamento: “educação para quê? Os universos educativos desperdiçados em Paraisópolis”.

A grande orientadora, Denise Paiero, e seus orientandos Bruna e eu

Inaugurada há mais de um ano, a Etec Paraisópolis sequer consegue formar uma turma de 40 alunos em seus cinco cursos oferecidos semestralmente. Enquanto, segundo último resultado do Enem, as melhores escolas públicas de São Paulo são as que oferecem o ensino técnico. E em meio a esse porquê e a fim de identificar e transformar essa realidade, nos propomos (e iremos fazer como prêmio) uma grande reportagem sobre o assunto.

Em setembro deste ano, fui ao Paraguai. Foi minha primeira viagem para fora do país. Ou melhor, foi minha primeira viagem fora da rota BA-SP. Meu irmão me pediu para lhe trazer um MP3. Outros amigos, algumas bugigangas. Trouxe a quebra do estereótipo daquele país de pessoas absurdamente simpáticas e a felicidade por ter viajado ao desconhecido. Foram cinco dias. No congresso que participei e na exposição a qual ajudei a organizar, confesso, foi uma das maiores experiências profissionais.

E exatamente um mês depois desse dia que considerei um marco na carreira, ainda como estagiário, ei-me no palco da maior premiação jornalística do país, para receber o certificado do prêmio que certamente é sonhado por qualquer estudante de jornalismo.

Nos poucos minutos após a declaração da Denise, naquela quinta-feira, me transportei a um passado recente. Flashs-back passavam diante de mim, enquanto ela procurava a página web do concurso para me enviar. Definitivamente era como se eu não precisasse terminar a faculdade para escrever sobre esses 4 anos de jornalismo. Mas ali permeado àquele anúncio me entreguei a uma sucessão de conquistas, e aquela era especialmente uma das mais belas.

Bruna Christina e eu, os premiados
Eu chorei. Chorei com uma emoção que não pude, talvez ainda não possa mensurar.  E por dentro de mim eu gritava, soltava rojões, pensava na minha mãe, lembrava da Bahia, das dificuldades que passei em São Paulo, dos estágios que percorri durante esses sete semestres de curso, no sentido da profissão, no futuro que está por vir, no jornalista que eu tenho me tornado e que poderei me tornar. Ganhei um importante concurso ainda como universitário. Mas essa não foi em si a maior conquista, e sim a certeza de que eu estava enfrentando - e vencendo - muitos monstros.

Aquela noite lembrei dos tempos de menino, quando insistia a minha mãe para que fosse às reuniões do colégio a fim de me envaidecer pelos elogios certeiros que receberia da professora.

Na cerimônia de premiação, no teatro TUCA, da PUC, a chuva que caiu aquela noite parecia me abençoar tão quanto o mesmo me fariam meus avós. Minha mãe não estava ali, talvez não estivesse por achar que seria um evento muito grã fino para uma pessoa simples como ela. Mas saberia de seu orgulhoso, embora sua ausência.

Recordo-me de minha 5ª série no ensino fundamental, quando fui selecionado para um curso de informática. Fui escolhido entre as cinco turmas, que partia da nomenclatura A até a E. Eu era da E. Foi lisonjeado pela seleção. 

Na noite do dia 24, foi a vez de ganhar o prêmio não menos importante do que a caixa de lápis de cor no pré-escolar, pelo desenho mais bonito da sala, em São Paulo. Ou o mosaico que mais chamou atenção na 6ª série, na Bahia. Recordei-me também da bolsa de estudos integral do Mackenzie, da bolsa do PIBIC, com a Iniciação Científica, da apresentação no Intercom por causa do artigo realizado, da migração entre os quatro estágios... Enfim, das pequenas coisas que me renderam grandes conquistas.

O prêmio Jovem Jornalista, do Instituto Vladimir Herzog, me traz como premiação a certeza de que posso continuar com minha caminhada, mesmo que muitas vezes ainda caminho com pés descalços ao longo diante de muitos obstáculos que apontam.

As três duplas premiadas

“Quem diria, Vagner de Alencar saiu de Barra do Choça e chegou aonde chegou”, em toda a oportunidade que lhe cabe, anuncia meu amigo Edy, em suas mensagens carinhosas ainda diz ser meu fã. Sempre retruco, perguntando se eu havia me tornado artista para ter fãs.  

As lágrimas de minha amiga Mayara ao Skype, me fizeram ser expectador de mim mesmo para perceber de fato aonde eu havia chegado. "Meu, não aguentei quando falei para minha mãe. Tô chorando aqui", revelou. E choramos juntos, revivendo nossos trajetos tão similares. Dos viventes da periferia que sabem que podem alcançar o mundo fora daquele que ainda é visto como marginal. Seu email ao grupo do Mural, depois de todos do blog ficarem sabendo por meio de uma das integrantes sobre o prêmio, me encheu de mais lágrimas: "Sim gente. Ganhou! Parabéns Vagner! Eu sei o quanto você se empenha e tanto de dificuldade que enfrenta. Isso é resultado de muito trabalho e amor pelo que você faz. Já disse várias vezes que sou sua fã né? É só uma das muitas conquista que ainda virão! Parabéns!"

Além de amiga, minha fã? Se pudesse ter feito algum discurso no dia da premiação, teria dito: “Dedico esse prêmio à dedicação e orientação da Denise, à parceira com a Bruna, à minha família, aos meus amigos de trabalho que aqui estão, e especialmente à minha mãe, que lá de cima, com certeza nesse momento está dizendo ‘Parabéns, meu filho, estou muito orgulhosa de você!”

7 comentários:

Rai Auri disse...

Saber que também saiu de Barra do Choça um exemplo como você. Parabéns, amei o texto! Sucesso, conterrâneo!

Unknown disse...

Valeu, Raí.
Confesso que tô morrendo de saudade de minha cidade! E quero comemorar aí, com todos, minha formatura.
Um forte abraço,
Vagner

pamellaindaia disse...

Parabééééns, Vagner! Sucesso, sempre!

Beijos,
Pam

Gislane Santos disse...

Parabéns, Vagner!!! Este é apenas um prêmio de muiiiitos que virão... Vc é um vencedor, em todos os aspectos!!!
Muiito orgulhosa de meu amigo...
Sucesso, sempre!
Bjsss Gislane

Ântoni disse...

Parabéns amigo!!Como sempre fazendo sucesso em tudo o que escreve!

Luisa Pierson disse...

Nossa Vagner, devo confessa que me emocionei demais com esse post. Apesar de já fazer um tempo que você escreveu.
Lindo! Muito lindo mesmo. Parabéns novamente.
Vagner, você é um grande exemplo e uma referência para mim. Você é um ser humano comum, um rapaz jovem, uma pessoa que nasceu em uma terra quente, escassa, cheia de dificuldades, mas recheada de vida, de luta, de amor, de coragem! A sua trajetória é uma belíssima lição de vida,um exemplo sólido e concreto de que vencer não é fácil, que perder faz parte, mas que é preciso ter coragem, é preciso acreditar, ter fé e principalmente agir! Agir em busca dos sonhos, agir em busca de um objetivo!
Confesso Vagner, que por vezes tenho inveja desse seu belo caminho pela graduação, da forma como aproveitou cada segundo dessa oportunidade. Mas, lindo é enxergar o passado, o trajeto percorrido. Você valoriza a vida e acredita no futuro construído no presente. Parabéns pelo prêmio, parabéns pela sua coragem, pela sua fé, pela sua ousadia! Obrigada por me ensinar, apenas com a sua presença diária a grande importância e beleza da força de vontade!

Douglas Oliveira disse...

Parabéns rapaz. Que este seja apenas um de muitos prêmios e reconhecimento a seu trabalho e talento. Abração! Douglas