quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Inimigo revelado


Em vez de amigo secreto, uma espécie de inimigo revelado. Antes dos presentes, um básico ritual: as DRs. À dianteira do mimo ao colega, primeiro, a lavagem de roupa suja. E na discussão do relacionamento, a dança das cadeiras dos namoros: fulano que pegou cicrano, que, por sua vez, brigou com beltrano por conta do chifre trocado.
Entre farpas e beijos, por fim os presentes nada imprevisíveis. Todos já haviam lançados seus desejos – alguns até experimentado as roupas futuras: a amiga que queria uma bata, o amigo que fantasiava um perfume. E embora a imprevisão, um presente extra. Sim. Sempre dois pacotes: um par de blusinhas, uma taça com uma toalha bordada com a frase no braço da tatuagem do preterido.




Eles se reuniram na casa de um dos amigos. Cada membro se incumbiu pelo ornamento da sala ou pela compra das rosas (brancas e vermelhas). As flores simbolizavam a paz e o amor: a branca aos antagonistas, para banhar o espírito da paz; a vermelha aos irmãos-camaradas.

A sala miúda acomodava o grupo. Uns sentaram-se nos sofás individuais que se juntaram para otimizar espaço, enquanto os demais se ajeitaram no chão sob o tapete limpo no dia anterior – com o olho arregalado da dona, atenta a qualquer possível ameaça ou, no caso, às batidas ou às cervejas ou aos vinhos, despejados no estofo. A prosa era ser regada a batida de maracujá, vodka com refrigerante de guaraná e latinhas geladas de Skin 350 ml.

A cerimônia fraternal teve início com um vídeo especialmente feito à ocasião. Na televisão de 21 polegadas, cada um dos 14 amigos-e-rivais tinham suas fotografias individuais expostas na tela – cada qual em uma situação específica. Em seguida, foi a vez dos vídeos (com imagens em movimento dos momentos das cachoeiras e das baladas), que solenizavam os instantes de risadas e diversão. A porta fechada abafava o ambiente, apartando a luz do sol que invadia a casa com uma quentura infernal.

Para um dos palestrantes à entrega dos presentes, 2012 foi um ano de perdas densas, mas também um período de aprendizado para o ano que adentra. Consciente dos flagrantes de confusões e revoltadas, a confissão era de amor. Quase como o texto “A quadrilha”, de José que ama Maria e Maria que ama que João... No entanto, apesar do amor incondicional, talvez a verdadeira razão para aquela irmandade era a tradição.

Há quatro anos, a trupe segue o rito. Enquanto um elemento do grupo se encarregou de produzir o videoclipe, outro se delegou em fabricar o CD exclusivo, com catorze faixas musicais com a canção predileta de cada componente.

Depois do troca-troca dos regalos, a feijoada. Pratos atulhados de feijão preto com farofa e saladas abandonavam a cozinha rumo ao assento mais próximo. Após o rango, melancia para refrescar a tarde que aquecia com pagodões e arrochas. Ao som das músicas que dominavam com destreza dançavam e cruzavam os olhares ternos e afetuosos, mesmo que de relance, e no lance de orgulho infeliz mostravam que a felicidade existe entre todos, que brigam e se amam com a mesma força que se odeiam. 

“O amor e o ódio vivem lado a lado”, profere um do grupo. E essa deve ser a principal razão para que entre estimas e desdéns eles jamais deixem de repartir a mesma casa, as mesmas bebidas e os mesmos sorrisos.

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