Foi com a indagação que intitula
essa crônica que Hiajaira me bombardeou quando nos vimos depois de alguns anos.
Na verdade foi um “Como assim?” demasiadamente surpreso, uma interrogação incrédula,
uma imprevisão renegada à priori.
Meados de junho deste ano, ei-me
novamente adentrando a Feira da Madrugada, local famoso pela venda de produtos
de baixo custo. Localizada na região central de São Paulo, a “Feirinha”, como é
chamada por alguns, foi o primeiro local onde trabalhei assim que cheguei na
capital pela última vez, em 2007.
Hiajaira era uma das clientes do
“Café do Trilho”, que de café não tinha nada. Num lugar minúsculo revezavam os
quatro funcionários: três atendentes, o caixa e o sub-gerente. Eu era o caixa,
o rapaz que ficava trancafiado dentro da saleta do lado de fora do trailer.
A nossa cliente passa por lá todos
os dias. Assim como grande parte dos comerciantes que ali ganham seu ordenado.
Hiajaira é peruana. Uma linda peruana de cabelos alisados naturalmente pela genética. Pele amorenada e traços finas. Tinha apenas 15
anos naquele tempo e adorava misto quente.
Três anos depois, regresso àquele
lugar que já não é mais o mesmo. Afinal, muito se mudou por ali, desde a organização
das barracas, até mesmo a área coberta que agora livra todos os comerciantes da
chuva.
A menina, que agora se encontra em
seus 17 anos, se surpreendeu assim que eu tirei o gravador e apanhei um bloco
de notas. “Como assim?”, atacou ela. Ora bolas, vim fazer uma entrevista com
você. Definitivamente ela não conseguia me visualizar com a profissão que ali
incumbia. Para Hiajiara, como aquele rapaz que encontra quase que diariamente
preso dentro daquele caixa havia tornado-se repórter?! A resposta foi “tornado-se”.
Podemos nos tornar nossos próprios heróis, ao invés de convivermos com o inimigo chamado "comodismo".
Veja também operando o caixa.
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