quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

A cama vazia de Mané



Mané não divide a cama com uma mulher já faz um bocado de tempo. Separado de Elenildes, sua ex-esposa, com quem esteve casado por, pelo menos, uma dezena de anos, passou a ser seletivo para com as mulheres. Preferiu apropriar-se definitivamente do clichê que não se cansa de arrotar, assim que é indagado por alguém que lhe exige explicação por sua ausência de uma ‘dona’. Desde que foi vítima da infidelidade conjugal, é “antes só do que mal acompanhado” que Mané garante ser sua principal filosofia de vida.

O filho mais velho de seu Manoel e dona Cleonice não pertence às estatísticas da média local de natalidade. Mané vive em um povoado de Barra do Choça (BA), o quase cinqüentão teve somente dois herdeiros – a maioria das famílias garante ao menos 4 a 5 crias.

Elenildo é o primogênito, no vigor de seus 23 anos. A caçula, Fernandinha, em breve, dará ao pai o primeiro neto. A adolescente saiu de casa depois de viver com a avó paterna; quis seguir a teoria da mãe de seu pai que pregava a libertinagem da neta. E a profecia se realizou. Em seus curtos 16 anos, Fernandinha se amasiou com um rapaz que, para o pai da mais nova grávida da praça, é “um moço direito”. O mancebo de 19 anos lucra um ordenado mensal considerável. O trabalho como gesseiro tem lhe consentido gastar com roupas caras, para revolta da avó da moça. Para dona Cleonice é preciso saber viver direito e não luxar como tem feito o casal de jovens.

É em cima duma moto peitada com o serviço de gesso em que o casal visita o pai e almoça, ora ou outra, com os avós. Com o bucho que agora guarda uma criança de sexo ainda indefinido a menina espera mais dois meses para parir.

Mané vive do trabalho da lavoura. É na colheita de bananas de espécies variadas a garantia de seu salário              invariável. Entre abres e fechas, ele mantém defronte a sua casa a venda sem nome. Duas mesas de sinuca vivem sempre ocupadas por jogadores amadores. Uma ficha custa 50 centavos – o mesmo preço de um copo de pinga. Fedegozo, carqueja e a clássica purinha são algumas dos tipos de cachaça que o bar dispõe aos fregueses. Ali não falta cerveja, nem refrigerante, assim como mortadela a cinqüenta centavos “um dedo”, amendoim, pimentinha e doces.

Mané é livre, não como os pássaros em que aprisiona em gaiolas feitas de taquara, mas convive sem a necessidade de uma “dona” ao seu lado. Se por amargar durante todos esses anos o peso da infidelidade, ou se por não sentir, de fato, a carência de uma presença feminina em seu lar, ele vive com a alegria do bar que, a cada final do dia, enche de fregueses quem lhe traz o sorriso alegre de quem não se esmorece com as traições da vida.

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Esta crônica faz parte da série "Cafés baianos", que conta as histórias de pessoas e dos povoados da cidade de Barra do Choça (BA) - cidade em que nasci e vivi alguns dos anos mais felizes de minha vida.

2 comentários:

Anônimo disse...

A tradicional vida na Roça...
muito bom garoto.

Tiago Fagner disse...

Realmente boa goroto! É um história triste, já que ele não conseguiu superar a traição, mas pelo menos encontrou outras alegrias para a vida, já que desistiu das mulheres, pelo menos fixas, na sua cama...