Desci a rua da Consolação em passos acelerados -- bem mais apressados do que os de costume. As pessoas e os carros passavam por mim quase que invisíveis.
À minha frente, uma tela imaginária exibia, em flashbacks -- assim como nos filmes --, uma série de
lembranças que sonhara eu estivessem apagadas há um bom tempo.
E quanto mais rápidas se tornavam as passadas, mais
fortemente ressurgiam as recordações. Elas que, infelizmente, haviam ganhado apenas um “pause”.
Eram pouco mais de 22h, e o único
passado presente naquela sexta-feira julina eram os momentos universitários
reportados numa mesa de bar, ao lado do Mackenzie, onde se graduaram a meia
dúzia de jovens jornalistas.
No entanto, os passos largos me levavam a um momento
interrompido há nove meses, exatamente ao mesmo lugar do primeiro e derradeiros
encontros, fruto de todas essas recordações que embriagavam minha alma ainda
recheada de melancolias.
Apressado, amparava a mochila nas costas com a mão esquerda, enquanto a bolsa batia a cada passo ligeiro. E quanto mais próximo eu chegava do destino final, paradoxalmente, desejava o atraso. "Assim, não a encontraria mais”, pensava comigo mesmo. Mas não.
Apressado, amparava a mochila nas costas com a mão esquerda, enquanto a bolsa batia a cada passo ligeiro. E quanto mais próximo eu chegava do destino final, paradoxalmente, desejava o atraso. "Assim, não a encontraria mais”, pensava comigo mesmo. Mas não.
Pouco mais de meia hora desde o primeiro contato, lá estava eu. Queria não ter recebido aquela mensagem no whatsapp, de um número desconhecido, perguntando como eu estava. “Estou bem”, respondi ainda sem saber quem era, até
que o armazenamento do contato por meio de uma letra aleatória, um “F”, trouxe imediatamente a figura do seu rosto negro e dentes alvos.
Quando cheguei na rua, já ao longe, pude notar que ela me
aguardava na parte inferior do bar. Abortei a pressa para falar comigo mesmo
instantes antes de encará-la definitivamente. “O que estou fazendo?”, me
autoinqueri, sem sucesso.
Ela arregalava os olhos e um sorriso em minha direção. Já eu não conseguia mirá-la proporcionalmente. Nos demos as mãos na grade que separava
o bar, de dois andares, da rua. Enquanto ela me olhava com aquele sorriso colossal,
minha face, sem expressão alguma, parecia carregar uma gigantesca interrogação. “Não vai entrar?”, me questionou. Sem dizer nada,
adentrei o espaço, assim que apanhei a comanda do segurança na entrada do
estabelecimento.
Com um copo de vinho branco na mão ela me abraçou firme, ao passo que meus braços compridos não tiveram forças para entrecruzar seu corpo magro.
“Quanto tempo...”, indagou ela, procurando iniciar um diálogo
pacífico. Mudo, eu procurava barrar uma possível explosão de frases impulsivas que
poderiam sair da boca de um típico ariano.
O bar estava cheio, tocava, randomicamente, estilos que
variavam do MPB ao sertanejo universitário. Subimos às escadas em direção à
mesa onde se encontravam três de seus amigos. “Você sumiu!”, disse um deles que
havia me excluído do Facebook há alguns meses. “É... Sumi”, controlando, com
moderação, o amargor por detrás das palavras que poderiam ser soltas a qualquer
momento.
“Você está mais bonito”, me elogiou ela, enquanto me olhava
como quem estivesse à frente de uma nova pessoa. “Continuo o mesmo... Assim
como a mim você me parece”, respondi, seco.
“Não sei... Você tá diferente”, insistiu.
“Pode ser a barba que tenha me dado um novo ar”,
contra-argumentei.
Com meus olhos fixos aos seus, embora a escuridão daquele
bar, eu buscava encontrar respostas dentro de suas pupilas dilatadas.
Defronte a um enorme espelho, na parte superior do
estabelecimento, ela via sua própria imagem. Sorridente, aparentemente feliz em
ver, me pediu para “abaixar a guarda” na tentativa frustrada de um abraço.
“Por que deveria?”, retruquei essa que era a indagação que
dominava qualquer discurso que eu pudesse empregar naquela noite.
“Por que... ?”, e antes de qualquer discussão de relação que não mais existia,
ela interrompeu o princípio do que seria um interrogatório, para se encostar
ainda mais próxima a mim.
E enquanto meu corpo desejava o seu, minhas lembranças
rememoravam, há nove meses, nós dois, sentados em uma mesa daquelas, trocando
beijos recíprocos e sorrindo, aparentemente felizes.
Porém, irresistivelmente, cedi. Envolvi seu corpo ao
meu e, ritmicamente, nos beijamos, beijamos... E, a cada intervalo, eu fixava meus
olhos nos seus à procura de respostas que decerto não seriam respondidas numa
noite que poderia ser resumir "a apenas uma noite".
“Havia esquecido que seu beijo era tão bom”,
revelou ela. “Você se esqueceu tanto coisa...”, completei, quase que em sussurros.
Ficamos ali por quase uma hora, até seus amigos a intimarem
sua despedida, muito postergada por ela, que amparava o copo na mão direita,
levemente cambaleante.
Descemos as escadas rumo ao caixa. Paguei apenas a entrada
no bar: R$ 6, enquanto ela desembolsou R$ 180. Já meio embriagada, demos um beijo de despedida
ainda dentro do bar. Um beijo com sabor de vinho branco, seguido de um toque no rosto.
Do lado de fora, o início do fim do reencontro foi selado por
sua inquisição. “E agora?”. Com sarcasmo, retruquei, emendando: “Meu número você
tem!”.
Viramos as costas, descortinamos as lembranças. E, confesso: não sei se definitivamente a taça foi quebrada ou se será remendada, se demos adeus ou um até logo.
Viramos as costas, descortinamos as lembranças. E, confesso: não sei se definitivamente a taça foi quebrada ou se será remendada, se demos adeus ou um até logo.
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