sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Vigilantes do Tráfico




















Eles são jovens.
Adolescentes
que sequer beiram a maioridade.
E de forma prematura, encontram-se no “mercado de trabalho”.
Eles são Vigilantes.
Vigilantes do Tráfico


A noite não é o sinônimo do prepúcio da vigília. O trabalho começa bem cedo, o sol mal se pôs e os vigilantes já estão a postos, independentemente de como o tempo esteja, seguindo como estabelece os direitos trabalhistas: oito horas de serviço + remuneração - só não lhes é fornecido o vale transporte ou alimentação, pois as residências dos "trabalhadores do crime" ficam na rua debaixo.

A empresa para qual eles exercem o ofício chama-se “Biqueira*” - a quem conheça pela alcunha de Boca de Fumo, apelidada de "Boca". Cada vigilante assume a porteira de uma das muitas vielas que cruzam os arredores onde o comércio funciona. Entre um córrego divido pela extremidade de uma e outra ruela, compartilhando espaço com ratos e dejetos das mais variadas espécies, os jovens vigilantes embalados ao som do estilo musical preferido, com as canções de rap, "viajam" e demarcam as histórias narradas em letras que retratam a realidade de ídolos do tráfico.

Os mesmos ouvidos afiados que apreciam a batida das músicas quase que autobiográficas são aqueles que atem-se a qualquer ruído estranho, diferente... de sirene. "É a polícia?!" Os olhos vivos dos vigilantes se esbugalham, assim que algo que fuja à normalidade é percebido.

Durante a vigília permanente, há aqueles que aderem à utilização dum banquinho convencional, embora haja quem opte por uma caixa de madeira utilizada para armazenar frutas e verduras para o descanso no decorrer de suas tarefas diárias, afinal de contas, repousar as pernas é indispensável quando, em muitos casos, delas se exige disposição para driblar, sob o breu das lâmpadas propositalmente danificadas pelos próprios vigilantes, os becos e vielas estreitas quando é necessário retirar-se em debandada para acionar que a polícia chegou na quebrada. Outros não se preocupam em manter-se em pé ao longo das horas correntes, pois o hábito há muito tornou-se rotineiro.

Não há gênero específico para tornar-se um vigilante. Ora ou outra é possível notar a presença de meninas desempenhando esse "serviço" - como vigilantes ou acompanhante do namorado, parente, amigo...

Àquelas em que a vaidade ficou apenas em revistas ou na televisão, as vigilantes do tráfico não se preocupam com modismos na hora em que de fato a "atividade" é realizada. Na cintura modelada, pochetes penduradas encontram-se abarrotadas de cápsulas e derivados de entorpecentes, além do dinheiro rendido por elas ao longo da labuta.

Pelo ar, seja dia ou noite, tampouco importa aos vigilantes, quando o vício fala mais alto nada cala e impede a "Boca de Fumo". A fumaça que se desmancha através da queima de cigarros e outras drogas ilícitas, demarcam o cenário de onde o "comércio" é realizado. Aquele que vigia é o mesmo que compra, e consequentemente o que também é usuário. São as drogas. É o tráfico.

Ali entre os estornos do esgoto à céu aberto os negócios são realizados. A compra e venda se estendem. Dinheiro. Baseados. Consumo de drogas. E claro, a vigília constante. Os "rendimentos" são efetivados. A partilha dos rendimentos, efetuada.

É madrugada afora que as drogas fortemente infestam o ambiente. É possível senti-la a metros de distância da "Boca", bem como dos pontos de permanente vigília. Na escuridão das ruelas, a única claridade que se observa é dos cigarros acessos, após o direcionamento de isqueiros e fósforos aos baseados habilidosamente equilibrados entre os dedos.

Diálogos, permeados por expressões do vocabulário próprio dos vigilantes, é, em muitas vezes, notado por agressões orais, quando, decerto, brigas e xingamentos mais concretos são regados pelo consumo ativo de álcool, e assim a treta acontece. "Se liga, maluco!"

Eles são jovens. Meninos e meninas, de 14, 15, 16 anos... Trocaram a escola que deveriam estar propriamente, pelo tráfico. Iniciaram prematuramente uma nova profissão: a de Vigilantes do tráfico.

Um comentário:

Robson Bezerra disse...

Uma matéria bem interessante e que nos faça refletir para a importância de buscarmos no dia 03 de outubro um candidato com propostas para a educação e segurança pública.