Dum lado um vereador eleito há quatro anos, doutro um
lavrador de lábia afiada a fim de trocar a lavoura pela Câmara Municipal. Na
roça, todos se conhecem – e o verbo conhecer é fundamental para o sucesso nas
eleições.
Os vereadores visitam as vendas dos eleitores, distribuem
sorrisos e pagam cerveja. É preciso manter sempre acesa a chama a popularidade.
Um copo de cachaça negado pode ser a razão perda de um voto. Na zona rural, os
vereadores (e até prefeitos) precisam reconhecer todas as residências de seus
prováveis eleitores, quando não nome e sobrenome de seus donos. Nos
estabelecimentos em que não dão as caras, sempre acenam, mesmo de longe ou
buzinam forte, mas não deixam de “marcar presença”.
A política na roça – pra não dizer em cidades pequenas –
funciona na base do tete a tete. A
palavra normalmente é levantada na promessa de um cento de blocos, da
construção dum banheiro, de uma dose cachaça ou meia dúzia de cervejas sobre o
balcão, claro, pagas. O povo na roça é vulnerável. Nessa lógica, é preciso que
o político pense sempre no individual, afinal, porque é difícil conseguir o
coletivo.
Em um domingo ensolarado em que a poeira embaça as garrafas
de cerveja num engradado dentro de um bar, um vereador retira e exibe duas
certidões de nascimento do bolso da camisa amassada. Sem agenda ou secretária, apenas
outros papéis avulsos, não precisa esforçar-se para guardar as atividades e
pedidos de favores alheios: a memória é sempre primorosa.
Dona Maria precisa da carteira de identidade, o vereador se
propõe a conseguir outra. Porém a certidão de nascimento está aos pedaços. É
preciso então tirar a segunda via do documento, para, então, obter o RG. E é o
próprio vereador quem se incumbe de tal serviço.
A história de amor entre político e eleitor na roça tem
prazo de validade: dura exatamente 4 anos. A cada mandato uma nova relação.
Quem pertencia ao lado situação e se bandeou para a oposição, é nome riscado da
lista. Os vereados eleitos – e principalmente ou não eleitos – sabem exatamente
de quem recebeu os votos. E não é mágica. É contabilidade. Contabilidade
enquanto o voto durar para sempre.
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